Capela São Benedito
Cidade: Jacarezinho / PR
Breve histórico
A Igreja (ou Capela) de São Benedito, localizada na região Norte do Estado do Paraná, na cidade de Jacarezinho, sobre uma praça que carrega o mesmo nome, denominada Praça São Benedito, estabelecida entre as ruas Dom Fernando Tadei, João Candido Fortes, Costa Júnior e Quintino Bocaiúva, na parte alta da cidade, considerada uma das construções mais antigas da região do “Norte Pioneiro” nela devemos reconhecer seu valor histórico, cultural, identitário e afetivo para a comunidade jacarezinhense e região.
Para ilustrar as origens desta construção, que já carrega mais de um século de história, coincidindo com a época de fundação da cidade, emancipada e tornada município no início do século XX, recapitulamos o seguinte relato de Thomaz Aimone, em seu livro intitulado Meu Ginásio Rui Barbosa de Jacarezinho, que nos traz recordações ainda anteriores ao ano de 1895, data em que teriam começado a serem erguidos os primeiros alicerces da atual Igreja, finalizada por volta de 1903: “Quem passava aos domingos, pelas proximidades da atual rua Costa Júnior, pois naquela época não possuía nenhum nome, ficavam admirados em ver uma grande quantidade de pessoas: homens, mulheres, crianças, todos negros cantando e dançando suas congadas; ficavam admiradas de ver a ordem e a disciplina reinante entre eles”.
Uma fé original
Um belo cenário onde era possível constatar que a maioria das pessoas que frequentavam o local eram negras e conviviam naquele espaço social, considerado um lugar sagrado, destinado ao culto e à realização de cerimônias religiosas onde havia um pequeno altar cercado com bambus, acolhendo a imagem de São Benedito, antes mesmo da edificação da Igreja.
Ademais, alguns vestígios da concepção de uma sociedade que, legalmente, havia acabado de sair de um modelo escravista, mas que na prática cotidiana, provavelmente ainda o mantinha, e que se admirava em “veja ordem e a disciplina reinante” entre a população negra ali residente, que, segundo Aimone, “não conhecia” a Lei Áurea que aboliu a escravidão no Brasil em 1888. Desse modo, conforme nos coloca o autor: “Os negros escravos não tinham o direito de estarem juntos com os senhores e seus parentes, razão porque resolveram pregar suas ideias africanas, nesta terra em que se encontravam em plena escravidão, por serem negros, mas, suas almas eram muitas vezes mais brancas do que os brancos”.
Uma Igreja só pra negros
Contudo, de acordo com a interpretação destas mesmas informações pela historiadora Luciana Evangelista, o líder dos trabalhadores que edificaram a primeira construção da Igreja (que teria sido reconstruída algumas outras vezes) era o ex-escravo Euzébio, que ao lado de “seus companheiros negros, não poderiam entrar na ‘Igreja dos brancos’, mesmo com o fim da escravidão”. Dona Joana Ferreira Inocente, entrevistada para o projeto, neta de senhor de escravos e frequentadora da Igreja desde 1926, afirma que, de acordo com o que dizia seu pai, “aquelas pessoas não eram mais tratadas como escravas, mas eram todos compadres e afilhados, apesar de ainda trabalharem para eles”.
A respeito das divergências, o fato é que os negros, naquele momento, ainda eram segregados e proibidos de frequentarem determinados ambientes, em particular, as celebrações na Igreja de São Sebastião, realizadas principalmente aos domingos e dias santos, e diante disso, faziam suas próprias celebrações e festejos no “largo” São Benedito, como era conhecido.
A construção
Para a construção da primeira edificação, o terreno teria sido cedido, ainda como nos revela Aimone, por seu proprietário, Capitão João Gasparino, que o ofereceu aos negros para que erigissem a Igreja, os quais, “entusiasmados”, deram início ao seu alicerce, feito com tijolos queimados e fabricados por eles em “caieiras” (espécie de forno) provisórias, uma vez que ainda não existiam fornos de olarias na cidade. Além disso, teriam ficado responsáveis pelo andamento da construção, Euzébio de Oliveira, que possuía muito prestígio entre os demais trabalhadores, juntamente com seu irmão Herculano Antonio Joaquim de Oliveira e seu compadre Eugênio, entre outros nomes. Ademais, eram feitas quitandas nas proximidades, que vendiam quitutes e quentão, além de se organizarem festejos nos quais se vendiam pão e pinga, de maneira que todo o lucro obtido era revertido em favor da construção do templo.
É possível constatarmos, portanto, através da história de construção desse espaço sagrado, a resistência da população negra desta cidade que, alvo de uma sociedade extremamente racista e segregacionista – racismo este ainda arraigado na sociedade brasileira -, se empenhou na edificação de sua própria Igreja a fim de exercer o direito de vivenciar sua religiosidade e sua devoção ao santo católico com o qual poderia realmente se identificar: São Benedito.
Ao longo do século XX: abandono, recuperação e lembranças dos “bons tempos”.
“A ‘São Benedito’ já foi muito animada, sempre cheia (…), e quando existia a associação ‘Filhas de Maria’, um grupo grande em Jacarezinho – eu fui ‘filha de Maria’ –, era tudo feito lá, nossas missas, retiros, era tudo ali, e tudo isso, infelizmente, foi acabando, diminuindo, mas tenho boas lembranças da Igreja, do meu tempo de criança e de moça”. As lembranças de dona Joana, acompanhadas por um tom de lamento, nos revelam certo abandono da Capela, com o passar dos anos, por parte da comunidade local, causado, muito possivelmente, pelo descaso no tocante à sua estrutura, o que, sem dúvida, ameaçava a segurança dos seus usuários, como veremos em seguida.
Entre construções e demolições
É do senso comum que a Capela “foi construída e reconstruída algumas vezes”, daí talvez a origem de algumas informações desencontradas, que diziam ter sido a construção demolida em determinado momento. Por falta de precisão das diferentes informações fornecidas, o que podemos afirmar é que, entre as décadas de 1950 e 1980, sua estrutura começou a ficar comprometida. O próprio Thomaz Aimone, que escrevia nesse período sobre a história da cidade, nos oferece o seguinte relato: “Hoje, a igreja São Benedito, a Pioneira de Jacarezinho, está prestes a cair como se fosse uma tapera e é justo que se faça uma reparação, (…)”.
Devido as sérias rachaduras, a Igreja fechou as portas para a realização de celebrações em seu interior, e isso, seguramente, fez com que “perdesse a animação” característica da Igreja, que estava “sempre lotadinha”, segundo dona Joana.
Porém, em finais da década de 1980, com o apoio do poder público e da iniciativa privada, a Igreja foi inteiramente revitalizada, sendo que sua estrutura física se mantém a mesma até os nossos dias, apesar de já apresentar alguns problemas, como rachaduras nas paredes superiores ao altar e infiltrações, que podem ser vistas do lado de fora.
Terminadas as reformas e quando de sua “reinauguração”, aproveitando as festividades e comemorações decorrentes do aniversário da cidade, contou com a presença da população local, assim como a do bispo D. Conrado Walter e do então governador do estado, Álvaro Dias.
Sendo assim, a recuperação deste monumento manteve, no geral, sua arquitetura externa de outrora, bastante simples, assim como sua decoração interior, muito agradável e acolhedora.
Características do Templo
Hoje, ao visitarmos a Igreja, podemos observar as seguintes características: suas paredes são todas revestidas na cor branca, tanto do lado de fora quanto em seu interior que, por sua vez, aparenta ter uma pintura mais recente, sendo que os detalhes estão todos em amarelo mostarda. Os vitrais das janelas – dispostas nas laterais da Igreja e também na parte da frente, ao lado da porta central – formam o desenho de uma cruz, e estão todos nas cores azul e amarelo. Possui, ainda, duas saídas laterais, uma porta central e uma porta aos fundos, além de uma torre com um sino, característico dos templos católicos, e que chama os fiéis para a tradicional missa de domingo. Em seu interior, bancos de madeira com estofados na cor verde musgo acomodam os visitantes, ladeados por imagens, entalhadas em madeira, que correspondem à via-sacra de Cristo. Aos lados da porta central, encontramos as imagens de Santo Antônio e Santo Inácio de Loyola, assim como um pequeno oratório, do lado direito de quem está entrando. Ao todo se somam seis estatuetas de santos na Capela, além dos já citados, podemos ver, ao lado do altar, Santa Terezinha, à direita, e Jesus Cristo, à esquerda. Em cima do altar, estão presentes Nossa Senhora das Graças, Santa Clara e o santo que dá nome à Igreja, São Benedito, que na disposição dos lugares, se encontra acima de todos os outros.
Espaço memorial
A necessidade de proteção da Igreja, portanto, assim como do ambiente no qual se localiza, se dá principalmente pela evocação de tantas lembranças e pelo grau de afetividade expressado, não somente pelos moradores locais, mas por toda a população de Jacarezinho devido as muitas e boas lembranças dos tempos áureos do local. Além das deliciosas quermesses, com campeonato de quadrilhas, são inesquecíveis as missas aos domingos à tarde, com a Igreja sempre lotada. As senhoras e moças usavam véus e, pelas cores, se distinguiam entre solteiras (branco), casadas (normalmente uma cor fria, pastel em geral) e preto para as viúvas ou para aqueles que estivessem guardando luto.
Por fim, à vista de toda a carga afetiva e de memória aqui retratada, deve-se considerar a importância de se proteger e manter a Igreja de São Benedito, enquanto patrimônio histórico da cidade, seja tratada a partir de uma dimensão humana, fundamentando-se no poder que este monumento possui enquanto referência para a identidade de grupos humanos, pelos valores que traduz ou expressa, pela capacidade de transmitir testemunho ou sentimento.
Agenda
Domingos: 18h Missa
Terça-feira: 19h30 Terço das Mulheres de Fé
Quinta-feira: 8h às 17h Adoração ao Santíssimo
Contato
R. João Cândido Fortes, 74, Jacarezinho – PR, 86400-000
Atendimentos: padres da Catedral Diocesana
Telefone: (43) 35250286
Face: Catedral de Jacarezinho
E-mail: catedraldiocesejacarezinho@uol.com.br
Autora: Marília Padilha Gomes
Colaboração: Caio Murilo
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